Sendo considerada um dos principais fatores de risco para a ocorrência de acidente vascular cerebral, infarto e insuficiências cardíaca e renal, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) — mais conhecida como “pressão alta” — tem se tornado mais prevalente no Brasil e no mundo. Fatores relacionados ao estilo de vida, como o tabagismo, estresse, prática insuficiente de exercício físico, alimentação desequilibrada e consumo de bebidas alcoólicas, influenciam na progressão da doença.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), se os governos conseguirem otimizar os cuidados na prevenção e tratamento de indivíduos com HAS, 76 milhões de mortes poderão ser evitadas entre 2023 e 2050. Assim, há um interesse crescente em novos métodos terapêuticos para a prevenção e cuidado desta condição.
Um dos ramos de pesquisa nesta área busca relacionar a saúde vascular com a saúde do intestino e resultados promissores já foram encontrados. Os achados na literatura científica destacam a associação entre a HAS com a integridade da parede intestinal e funcionalidade do intestino. Duas vias metabólicas parecem justificar a relação:
- A partir da fermentação de fibras provenientes da dieta, diversos grupos bacterianos produzem ácidos graxos de cadeia curta (AGCC), que desempenham papel importante na regulação da pressão arterial através de seus efeitos anti-inflamatórios.
- A microbiota intestinal também é capaz de produzir outra substância que, ao ser metabolizada pelo fígado, é transformada em n-óxido de trimetilamina (TMAO). Um estudo de alta evidência científica mostrou que indivíduos com níveis elevados de TMAO apresentavam uma incidência significativamente maior de HAS em comparação com os indivíduos sem a patologia.
Sabe-se que cepas probióticas de lactobacilos e bifidobactérias são capazes de produzir AGCC e de reduzir a formação de TMAO, se mostrando como possíveis aliadas ao tratamento do paciente hipertenso.
Reforçando o potencial benéfico da suplementação probiótica, uma meta-análise e revisão de 14 artigos científicos identificou que a administração de probióticos pode ser eficaz na redução da pressão arterial de indivíduos hipertensos, principalmente quando a HAS está associada ao diabetes. Esse estudo também sugere que o efeito da suplementação seja maior quando ela é administrada em doses maiores que 2×10^10 UFC de probióticos ao dia por no mínimo 4 semanas.
A suplementação de probióticos com o fim de equilibrar a saúde do intestino parece ser uma abordagem terapêutica promissora para complementar a terapia anti-hipertensiva tradicional e o estilo de vida saudável.
A doença periodontal (DP) é causada por processos de adesão e agregação bacteriana na cavidade oral, gerando uma inflamação oral que afeta os tecidos que circundam e sustentam os dentes. A condição pode causar sangramento e inchaço das gengivas (gengivite), dor e mau hálito, comprometendo a mastigação, autoestima e a qualidade de vida de quem é acometido por ela. Além disso, a DP está associada a outras patologias sistêmicas como o diabetes mellitus, doenças cardiovasculares, artrite reumatoide e doença pulmonar obstrutiva crônica. Acredita-se que essa relação ocorra por conta da disseminação sistêmica de microrganismos, seus produtos e fatores inflamatórios que aumentam nos tecidos bucais.
É estimado que a DP grave afeta cerca de 19% da população adulta mundial — representando mais de 1 bilhão de casos — e espera-se que sua prevalência aumente nos próximos anos devido ao crescimento da população idosa. Assim, é importante a busca por métodos preventivos e terapêuticos no manejo desta doença e o uso de probióticos tem se mostrado promissor.
Embora o mecanismo de ação dos probióticos na cavidade oral ainda não esteja claramente estabelecido, a literatura científica menciona os seguintes potenciais que os probióticos parecem desenvolver nos cuidados da saúde bucal:
- Redução da contagem de microrganismos patogênicos na boca;
- Modulação da resposta inflamatória;
- Produção de substâncias (ácido lático, peróxido de hidrogênio e bacteriocinas) que inibem o crescimento de patógenos;
- Competição por nutrientes e superfícies de adesão, levando ao deslocamento de patógenos;
- Modificação da composição do biofilme (película fina que envolve os dentes e é formada por microrganismos e toxinas produzidas pelos mesmos).
Um ensaio clínico randomizado controlado por placebo buscou avaliar os efeitos de pastilhas probióticas contendo 10^9 UFC de cepas de Bifidobacterium lactis HN019 como adjuvante no tratamento da raspagem e alisamento radicular (padrão ouro para o tratamento da periodontite) em pacientes com periodontite crônica. O grupo que recebeu as pastilhas probióticas foi orientado a administrá-las duas vezes ao dia (ao acordar e antes de dormir) por 30 dias e, após o período, foram observados os seguintes resultados:
- Níveis de fator anti-inflamatório (interleucina-10) aumentados em relação ao início do estudo;
- Menor proporção de citocinas inflamatórias (IL-8 e IL-1β) em relação ao grupo controle (que não recebeu a suplementação);
- Menor risco de progressão da DP;
- Menor taxa de pacientes com necessidade de tratamento periodontal adicional em mais de três locais;
- Número reduzido de bolsas moderadas e profundas em relação ao grupo controle.
Sendo assim, a terapia probiótica se mostra uma potencial aliada ao tratamento não-cirúrgico de indivíduos com DP, embora seu uso não substitua a técnica diária de higiene bucal. Ademais, ainda são necessários mais estudos que reconheçam cepas específicas com atividade probiótica, assim como a dose exata, tempo de tratamento e os veículos ideais para os cuidados da DP.
Referências
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